Novo túnel Guaratiba no mapa urbano sem projeto contra crescimento desordenado


RIO - Se Tim Maia fosse vivo, talvez estivesse na hora de ele começar a pensar numa nova rima para o clássico "Do Leme ao Pontal". Previsto para ser inaugurado até o fim de junho, junto com o corredor viário Transoeste (Barra da Tijuca-Santa Cruz), o Túnel da Grota Funda deve trazer de vez as localidades de Barra e Ilha de Guaratiba para o mapa urbano do Rio de Janeiro. Mas, na nova fronteira da cidade, a expectativa por um transporte mais eficiente contrasta com o medo de um crescimento desordenado: a própria prefeitura admite que a legislação que rege as construções na região - elaborada na década de 1970 - está defasada. Um Plano de Estruturação Urbana (PEU) está sendo preparado, mas só deve efetivamente começar a valer daqui a cerca de um ano e meio.
FOTOGALERIA:
A nova fronteira em imagens
Um olhar do outro lado da Serra da Grota Funda dá uma ideia do que pode estar por vir se não houver planejamento. O Recreio dos Bandeirantes, bairro que será diretamente ligado a Guaratiba após a inauguração do túnel, mais do que dobrou a sua população em dez anos. Em 2000, tinha 37.572 habitantes; em 2010, o censo do IBGE registrou 82.240. Nesse período - apesar de ter ao menos uma legislação urbanística que impôs prédios de baixo gabarito entre boa parte da orla e a Avenida das Américas -, a região viu crescer uma favela que ganhou o status de epicentro da desordem urbana no Rio: o Terreirão, que tem hoje cerca de 80 mil metros quadrados. Somente de 2009 para cá, a prefeitura demoliu 340 unidades comerciais e residências ilegais no bairro.
- Se a cidade cresce sem normas e sem um plano de desenvolvimento que leve em conta a sustentabilidade social, quem se torna o grande urbanizador são os loteadores clandestinos - alerta o arquiteto Canagé Vilhena, morador de Vargem Pequena, bairro que fica na mesma região e também sofre as consequências do crescimento desordenado.
Em Vargem Pequena, a população mais do que dobrou em dez anos: saiu de 11.536 pessoas em 2000 para 27.250 em 2010, segundo dados do IBGE. Também há problemas sérios de infraestrutura, como falta de asfaltamento ou rede de esgoto, além da proliferação de loteamentos ilegais. O próprio PEU da região, aprovado na Câmara em 2009, ainda é até hoje motivo de questionamento na Justiça.
Em Barra e Ilha de Guaratiba, mesmo sem o túnel pronto, a região mescla os ares de cidade do interior com os primeiros sinais de adensamento sem regras. O zoneamento em vigor coloca praticamente toda a área dentro da Zona Residencial 6. Ou seja, pela antiga lei, que leva em conta características estritamente rurais das localidades, só seria possível uma construção por lote de dez mil metros quadrados. Mas basta dar uma volta pelas principais ruas para ver que a realidade é diferente: condomínios de belas casas ou mesmo casebres com aparência favelizada dividem a paisagem com os sítios que ainda resistem.
O secretário municipal de Urbanismo, Sérgio Dias, não quis antecipar detalhes do PEU de Guaratiba, alegando que ainda há apenas um esboço do trabalho final. A conclusão só deve sair no segundo semestre. A partir daí, ele admite que a tramitação na Câmara deve durar aproximadamente um ano.
- Deveremos abrir a possibilidade para lotes menores, mas com gabarito baixo - adianta Dias.
Enquanto o PEU não vem, a proliferação de irregularidades incomoda quem tem planos para a região. Morador de Copacabana, o arquiteto Marco Aurélio Barçante sonha há mais de 30 anos em tornar realidade o projeto de um miniresort num terreno que possui em Barra de Guaratiba, mas não tem como legalizá-lo:
- Quem tem projetos interessantes para a região e quer fazer de forma legal não pode. Enquanto isso, os invasores vão fazendo seus loteamentos irregulares.
O secretário Sérgio Dias admite a dificuldade de fiscalizar:
- Não conseguimos fazer policiamento em toda a cidade. Nós notificamos, autuamos, embargamos, mas ainda assim muitos insistem e constroem, mesmo sabendo que nunca terão o habite-se da prefeitura.
Às margens da Serra da Grota Funda, que até a inauguração do túnel é a principal ligação entre Recreio e Guaratiba, uma construção vem chamando a atenção de quem teme a favelização na região. Há cerca de dois meses, foi montado um terreiro de umbanda, que também serve de moradia, na beira da estrada. Na última quarta-feira, nos fundos dessa construção, repórteres do GLOBO flagraram operários preparando cimento e dezenas de tijolos armazenados. Uma mulher, que se apresentou como Ivânia Moura de Paiva, disse que é dona do imóvel e que tudo estava regular. Mas o subprefeito da Zona Oeste, Edimar Teixeira, afirmou que o local é área não edificável e que já foi entregue uma notificação aos infratores.
- Na segunda-feira, vamos voltar ao local - garantiu Teixeira.
Aposta em plantas e gastronomia
Em Pedra de Guaratiba - que fica separada de Barra e Ilha por uma grande área de reserva, boa parte pertencente ao Exército -, a favelização já é uma realidade. A comunidade do Rio Piraquê foi a que mais cresceu na cidade horizontalmente nos últimos anos. Entre 1999 e 2008, segundo o Instituto Pereira Passos (IPP), avançou 81%, passando de 234.116 metros quadrados para 423.532.
Para tentar promover o crescimento sustentável, quem mora e tira seu ganha-pão na região aposta na formação dos polos, que têm apoio da Secretaria municipal de Desenvolvimento Econômico Solidário. Em Ilha de Guaratiba, uma associação criada recentemente reúne 38 produtores de plantas ornamentais. Mas a estimativa é que haja 400 na localidade. O agrônomo Ingo Haberle desenvolve um projeto-piloto de cultivo de palmeiras-reais como opção ao plantio de bananeiras nas encostas.
- É preciso pensar em opções de renda que são sejam nocivas ao meio ambiente - afirma ele.
Em Barra de Guaratiba, a já conhecida gastronomia de frutos do mar promete crescer. Ao longo do corredor viário, a prefeitura instalará sinalização remetendo ao local e há expectativa de confecção do "guia das tias", contando a história dos famosos restaurantes da região.
No Recreio, um caminho só a pé para Grumari
Bem perto do Túnel da Grota Funda, que promete ser o mais moderno do Rio, existe uma via praticamente desconhecida, onde sequer é possível trafegar de carro, em pleno bairro do Recreio dos Bandeirantes. Uma bifurcação na Estrada do Pontal leva à antiga Estrada de Grumari. Ao longo de uma trilha de quase uma hora que termina na praia, há 35 casas - e boa parte dos moradores já está por lá há décadas. Na primeira residência do caminho, está Jorge dos Santos, de 73 anos, que vive sozinho ali há 16 anos.
- Vocês têm que vir com calma um dia para conhecer tudo direitinho - convidou o hospitaleiro Jorge ao se despedir dos repórteres na última quarta-feira.
O caminho da antiga estrada é formado por grandes pedregulhos. Na entrada, foi improvisado com madeira e telhas um estacionamento para os carros de quem mora ali. Antônio Mateus, de 54 anos, contou que sobe e desce todos os dias a Serra de Piabas a pé. Ele reclama principalmente da falta de acesso a serviços básicos:
- Já pedimos por diversas vezes para que a concessionária instale a energia elétrica para nós, sem sucesso. Queremos pagar a conta, mas, como não conseguimos, acabamos apelando para o "gato" (ligação clandestina).
O tempo de uma hora entre uma ponta e outra da Estrada de Grumari é o mesmo que a prefeitura promete de ganho no trajeto entre Santa Cruz e Barra da Tijuca, com a inauguração do Transoeste. A duplicação da Avenida das Américas está praticamente concluída do início do Recreio até o túnel, faltando só a conclusão de um viaduto, o que deve ocorrer até fim deste mês.

FONTE YAHOO
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